Artigo – Controle Supremo (por Marcel Eduardo de Lima)

13/01/2012 | Notícias & Artigos

Prestes a completar seis anos de sua criação, o Conselho Nacional de Justiça continua a ter sua atuação questionada, embora com clara timidez por parte de alguns setores do meio jurídico.

Certamente, a criação de um órgão de “controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes”, nos termos do artigo 103-B da Constituição Federal, representou importante conquista para o Estado Democrático de Direito. Afinal, a bem da transparência no desempenho das atividades públicas, de fato não se poderia conceber a existência de um Poder que não estivesse sujeito a qualquer espécie de fiscalização externa.

Entretanto, desde sua efetiva instalação, em 2005, o que se tem notado por parte do CNJ é uma atuação que, não raro, extrapola os limites de seus poderes e ignora o objetivo de “modernização, desburocratização e eficiência” do Poder Judiciário que a deveria nortear, conforme estabelece o artigo 4º, inciso XXVIII do seu Regimento Interno.

Extrapola os limites de seus poderes ao, por exemplo, declarar vagos, indistintamente, mais de 5.500 cartórios em todo o Brasil, desconstituindo investiduras realizadas, em alguns casos, há quase duas décadas.

Ignora o objetivo de “modernização, desburocratização e eficiência” da Justiça ao estabelecer metas por vezes absolutamente inatingíveis aos magistrados, ao definir prazos exíguos para adequação dos Tribunais às suas exigências e ao privilegiar a quantidade em detrimento da qualidade da prestação jurisdicional.

Felizmente, contudo, o Supremo Tribunal Federal já dá os primeiros indícios de que irá coibir os excessos cometidos pelo órgão. No caso específico de cartórios do Paraná, dezenas de liminares já foram concedidas pelos Ministros do STF, de modo a preservar  princípios constitucionais basilares, como da segurança jurídica, da lealdade e do ato jurídico perfeito.

Aludidas decisões, em síntese e em sua maioria, reconhecem que não se pode simplesmente desconsiderar o transcurso de tempo desde a investidura dos titulares, o fato de terem ingressado por meio de concurso público regular, permutado com fundamentoem Lei Estaduale de haver transcorrido o prazo decadencial para a administração pública rever atos praticados (artigo 54 da Lei 9.784/99).

Cumpre esclarecer, por oportuno, que decisão tomada pelo STF em dezembro, e amplamente divulgada pela mídia, não altera em nada essa tendência. Afinal, julgou-se um caso em que não teria havido concurso enquanto que, na grande maioria dos mais de 400 cartórios paranaenses declarados vagos, os titulares foram, sim, aprovados em concurso público regular. 

Por estas e outras razões, inclusive, o Ministro Ayres Britto, em algumas de suas decisões mais recentes, foi categórico ao afirmar que “é hora de aplicar um “freio de arrumação” no equacionamento jurídico da matéria”.

A partir desta clara sinalização do Supremo Tribunal Federal, o que se espera é uma mudança de postura por parte do Conselho Nacional de Justiça, de forma a resgatar suas verdadeiras funções constitucionais e regimentais, a partir de iniciativas como a unificação dos sistemas informatizados utilizados pelos Tribunais para tramitação dos processos eletrônicos; a exigência de disponibilização, via internet, por parte das serventias, de todos os atos e decisões judiciais; e o apoio aos movimentos pela criação e fortalecimento das Defensorias Públicas dos estados, entre outras. Medidas simples mas que já representariam uma grande colaboração a jurisdicionados e profissionais da área jurídica.

Talvez assim o Conselho Nacional de Justiça pudesse recuperar credibilidade e atender às expectativas que sobre ele foram depositadas por ocasião de sua criação.

Enquanto isso não ocorrer, caberá ao Supremo Tribunal Federal continuar “freando” as eventuais extravagâncias cometidas pelo CNJ, atuando como uma espécie de “controle interno do controle externo”, por mais paradoxal que isso possa soar.

 

Marcel Eduardo de Lima – advogado e sócio do escritório Ceschin, Moura Ferro, Lima & Advogados Associados – Artigo originalmente publicado na Gazeta do Povo, em 15/02/2011.